Apenas 30% dos discentes em Medicina pretendem trabalhar na Estratégia de Saúde da Família
Por Rui Gilberto Ferreira, presidente da Associação Médica de Goiás
Cerca de 70% dos discentes da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás NÃO pretendem trabalhar na Estratégia de Saúde da Família. O dado faz parte da pesquisa realizada, em 2012, pelo mestrando Marcos Augusto Filisbino em sua dissertação da pós graduação A Graduação Médica e a Prática Profissional na Perspectiva de Discentes do Internato de Medicina. O estudo foi feito com alunos do 5º e 6º Ano do curso de Medicina da Universidade Federal de Goiás.
Na pesquisa, constatou-se ainda que, no perfil sócio-demográfico, os discentes possuem em média 24 anos, sendo que 66% pertencem às classes A e B. O relatório da prática profissional demonstra que 96% desejam cursar a residência médica 84% pretendem ser especialistas. O baixo índice, 23%, do desejo dos graduandos em tornar-se generalista está associado ao baixo reconhecimento profissional da prática, além das dificuldades de progressão na carreira.
A Estratégia Saúde da Família (ESF), segundo as palavras da Secretaria de Atenção à Saúde, visa à reorganização da atenção básica no país, de acordo com os preceitos do Sistema Único de Saúde, e é tida pelo Ministério da Saúde e gestores estaduais e municipais como estratégia de expansão, qualificação e consolidação da atenção básica.
Considerando que a ESF é a principal política pública de saúde vigente no Brasil, no sentido de reorientar o atendimento na lógica da integralidade, e analisando os dados da pesquisa realizada por Marcos Filisbino, percebemos uma clara discrepância entre as expectativas dos futuros médicos e a demanda do serviço de saúde pela sociedade brasileira. São apenas 23% dos formandos intencionados em participar ativamente do serviço e os motivos são claros: a falta de investimentos por parte do Governo na saúde pública brasileira, a falta de um Planos de Cargos, Carreira e Salários para os médicos e falta de infraestrutura para um trabalho digno que atenda as necessidades dos milhares de usuários do Sistema Único de Saúde que todos os dias esperam horas nas filas por um socorro justo e humano.
Socorro é o que pedimos a classe governamental deste país que insiste em culpar os médicos pela situação precária da saúde pública no Brasil. Somos colocados como vilões enquanto estamos de mãos atadas para desempenhar nosso trabalho com dignidade. Falta algodão, falta medicamentos básicos, faltam leitos, faltam investimentos, falta boa vontade e competência. Sobram medidas paliativas para tapar a ferida com pontos podres.
Dados do Conselho Federal de Medicina afirmam que existem no Brasil 388.015 médicos. O número só tem crescido nas últimas décadas. No Brasil, até outubro de 2013, havia 202 escolas médicas em atividade, mais uma federal em implantação no Rio Grande do Norte, com previsão para início do curso em 2014. De 2000 a 2013, foram criadas 94 escolas médicas.
Ampliar ainda mais esses números não preenche as lacunas das péssimas condições de saúde em nosso país. São necessárias medidas imediatistas para reverter este quadro como a aprovação do projeto de Emenda Popular Saúde + 10, que exigirá 10% da receita bruta federal voltada para a saúde pública, significando mais R$58 bilhões por ano de investimento. Outras ações devem ser realizadas, como a implantação do Plano de Carreira de Estado para os profissionais que atuam na saúde pública; a validação, de acordo com as nossas leis, dos diplomas de médicos formados em outros países, seja brasileiro ou estrangeiro; e que permaneçam somente as faculdades de Medicina que tenham condições adequadas de ensino.
Não podemos desviar o foco. O governo federal não pode persistir no erro do diagnóstico. É como colocar a culpa no sol pelo aquecimento global e esquecer toda a degradação humana ao meio ambiente. Justo o sol, que insiste em brilhar e nos trazer luz.